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Trivial e Singular

Um blog simples e único sobre as trivialidades e singularidades da (minha) vida

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A triste conformidade das mulheres

No dia de hoje proliferam nas redes sociais e em múltiplas campanhas publicitárias frases alusivas ao dia internacional da mulher, desejando às mesmas parabéns por serem mulheres e os votos de um feliz dia. Mas será que isto faz sentido? Sempre me questionei sobre a razão da comemoração deste dia e por que motivo se comemora o ser mulher e não o ser homem. Claro, que à semelhança de outros dias comemorativos, também para este existe uma boa explicação. Quando se procura perceber a razão deste dia são várias as explicações que surgem e variados os episódios relatados, que servem como sustento à existência deste dia. Ainda que a verdade e veracidade dos factos não esteja totalmente clara, é inegável que este dia existe para assinalar as conquistas das mulheres e para promover a luta pela igualdade entre homens e mulheres. Ao contrário do que acontece com o feriado de 25 de Abril, em que se celebra o fim da ditadura, da opressão e se proclama a conquista da liberdade, penso que no caso do dia da mulher, a conquista dos seus direitos ainda não foi plenamente conseguida.

 

Em Portugal, a minha geração de mulheres sofreu pouco com as diferenças de género. Já crescemos com um conjunto de direitos adquiridos, não tivemos que travar lutas para poder ter direito ao voto, as escolas têm turmas mistas, os rapazes e as raparigas convivem desde sempre no mesmo espaço, os homens e as mulheres frequentam a universidade, tiram cursos superiores, trabalham, viajam, casam, divorciam-se, etc.. no entanto, esta feliz realidade afasta-nos da realidade que se vive noutros cantos do mundo. Noutros países, as mulheres não podem votar, têm “donos”, são vítimas de tráfico e exploração sexual, são vendidas pelos pais, são marginalizadas, não têm direito a mostrar-se, a defender-se e acima de tudo à igualdade e à total liberdade. Em Portugal, e na Europa, felizmente a realidade é bastante diferente, mas ainda assim está longe da perfeição. A maioria das mulheres portuguesas trava lutas em casa, com o marido, o pai e as expetativas sociais. Muitas mulheres desempenham sozinhas as tarefas inerentes à vida doméstica e à educação dos filhos, sem verdadeiro direito a opinião nas principais decisões familiares, como comprar casa, carro ou a gestão do dinheiro. Muitas recebem mesada dos maridos, são controladas por eles no que fazem, no que vestem, no que dizem. Muitas mulheres são pressionadas, forçadas a prestarem serventia aos maridos. Muitas mulheres são ainda vítimas de violência física, verbal e psicológica. E se em relação ao primeiro tipo de violência a sociedade está mais consciente de que não pode acontecer, já no que concerne à violência psicológica e verbal ainda é necessária uma grande evolução das mentalidades.  

 

Para além da luta no seio familiar que muitas mulheres vivem (espero que cada vez menos), a maioria de nós enfrenta outras formas de discriminação diárias na sociedade. Acontecem a olhos vistos e são na maioria das vezes aceites com conformidade, como se de uma realidade inalterável se tratasse, até mesmo por parte das mulheres. E aqui refiro-me às diferenças nas oportunidades de carreira, às desigualdades salariais e na conquista de postos de chefia ou de elevada representação. Todos nós sabemos que a mulher vive o estigma de poder vir a ser mãe e por isso poder ficar em casa de licença uma série de meses, de poder ter de faltar para levar o filho ao médico, de não se dedicar totalmente ao trabalho, porque tem uma família para cuidar. Isto acontece hoje. Já foi pior, mas continua a acontecer e acredito que se irá perpetuar durante bastantes anos, especialmente, porque num dia dedicado à celebração dos direitos das mulheres, estas não se juntam para debater o que de diferente podem fazer na sociedade para diminuir as desigualdades. As mulheres, neste dia, preferem ir jantar fora em bando, receber presentes dos homens e sair com as amigas, como se isso importasse para alguma coisa. Quando uma mulher se sente feliz e realizada por ir jantar só com mulheres no dia de hoje, como fator representativo da conquista de direitos similares aos dos homens – sair com amigos para comer e beber - , então significa que longe está o dia em que as mulheres serão de facto iguais aos homens. E para mim, o pior de tudo, é que são as próprias mulheres a sentirem-se felizes com estes comportamentos e estas diminuídas formas de igualdade. São elas que se acomodam e não lutam pela mudança. Apesar de ser a elas que está vedado o total acesso à liberdade e à igualdade nas suas vidas, nas suas casas, nos seus locais de trabalho e na sociedade.